Sonhos D’ouro (José de Alencar)


Ricardo era um rapaz pobre e que saíra de São Paulo onde morava sua mãe, irmã e sua noiva Bela para ir à Corte tentar conquistar o suficiente para dar uma vida digna a elas. E foi no Rio de Janeiro, mais precisamente, na Tijuca, que teve seu primeiro encontro com Guida. Ele estava deitado na relva sonhando com as facilidades que a riqueza traria e beijava uma pequena flor que colhera e apelidara de sonhos d’ouro. Nessas circunstâncias foi que Guida o encontrou, enquanto fazia um passeio com sua dama de companhia e o Sr. Benicio, que tinha uma alma servil e trabalhava para ela. 

Depois deste primeiro encontro, Ricardo veio saber a partir de seu amigo Fábio, e noivo de sua irmã Luísa, que a moça era filha do “comendador” Soares e era uma das mais ricas e belas moças da corte. Ricardo inicialmente sabendo das travessuras da menina a julgou caprichosa. No decorrer dos dias sempre em passeios no Galgo, o cavalo que dividia em um revezamento com Fábio, encontrava-se casualmente com Guida. 

Ricardo morava com Fábio e D. Joaquina, mãe de seu amigo. Era costume dela, mesmo pobre, ajudar uma família que de vez em vez precisava de socorro. Foi graças a essas boas ações que um dia Ricardo, ganhando um dinheiro extra, resolveu ajudar a família, desencarregando D. Joaquina. Lá ele estava com seu caderno onde pintava e na página aberta estava uma aquarela em referência ao seu primeiro encontro com Guida. Nesse dia Guida também veio visitar essa família e inocentemente viu de relance o desenho de Ricardo. 

Guida era de fato linda e rica, era também caprichosa, mas era uma alma muito boa, gentil e brincalhona. Prova de sua natureza caprichosa foi o desejo insistente que lhe nasceu de descobrir porque Ricardo beijava tão ardentemente aquela flor do seu primeiro encontro, queria ver o desenho que ele fizera e queria possuir o cavalo do rapaz, o Galgo. 

Estando em um grupo em um passeio na Tijuca, Guida viu a pequena flor e se precipitou para colhê-la, porém era uma ação perigosa, e Ricardo que observava toda a cena, acabando de chegar àquele ponto, se adiantou e colheu as flores. Nogueira, um dos rapazes do grupo, cumprimentou a ele, pois tinham se formado juntos. 

Mais tarde, durante o almoço na casa de Soares, Guida convenceu Nogueira de convidar Ricardo e também o amigo do rapaz para irem jantar ali naquele dia. Ricardo já tinha negado o convite feito através de um dos trabalhadores da casa, não querendo se envolver com uma sociedade a qual não pertencia. Nogueira foi então atrás do colega, porém encontrou apenas Fábio e esse garantiu que ele e o amigo estariam lá. 

Ricardo só foi porque Fábio disse que havia dado sua palavra de honra. Assim passaram a noite muito bem, melhor Fábio que não tinha acanhamento em se “infiltrar” em meio as pessoas. No dia seguinte, lá estavam reunidos novamente para um passeio, Ricardo dessa vez foi temendo que negando o convite Fábio aceitasse e agisse de forma pior como vinha agindo, sem pudor algum. 

No passeio Ricardo concedeu que Guida fosse no Galgo. Durante todo o dia Ricardo a esteve observando, pois, o cavalo era muito afoito e um acidente era fácil. Observava também a Flávio que não parava de flertar com D. Guilhermina. Foi em um momento desses que Guida partiu em uma corrida no Galgo; Ricardo instantaneamente tentou alcançá-la, acabando com ela voltando em seu cavalo e ele no dele, e ela falando em como ele suporá mal se tivesse acreditado que ela esperava que ele a socorresse como heróis em romances. 

Ricardo já fadigado articulou um modo de escapar do resto do passeio. Porém, na sua tentativa de fuga, acabou seguindo apenas ele, Guida e o S. Benicio que insistia em cobrir-lhes com o guarda-sol. Enfim todos chegaram à casa de Soares e todos notaram como Ricardo e Guida chegaram conversando e rindo. Durante a noite todos já supunham que ele se juntava aos outros três concorrentes a marido e que ele era o escolhido. 

Assim, o visconde que participa da intimidade da casa, já se precipitou ao escritório de Ricardo para lhe propor uma negociação no casamento. Ele lhe ajudaria financiando o namoro e depois já casado Ricardo lhe prestaria favores. Mas a reação dele foi pôr o visconde pelas golas fora do seu escritório. Mais tarde Fábio contou tal fato a Guida e esta pediu ao pai que retirasse o visconde de seu círculo de amizade. 

Passou-se um bom tempo, e Guida completou seus dezenove anos, também nesse tempo Ricardo tinha avançado em seu escritório e já trabalhava com casos que lhe rendiam mais e tinha alugado um quarto. Guida, assim como combinara com o pai, deveria escolher um noivo e apresentá-lo ao pai e este, por sua vez, iria ver se concedia ou não o casamento pois não teriam um ano para ver qual dos dois se enganava sobre o candidato, Guida ou ele. 

Foi assim que em uma manhã, Soares conversou com sua filha, falou-lhe que era preciso que escolhesse um noivo, pois ele estava envelhecendo e não podia deixá-la solteira, uma vez que agora já muitos se aproximavam pelo dinheiro que eles possuíam e quando ela estivesse sozinha maior seria o número de especuladores. Assim Guida prometeu em um mês achar o rapaz. 

Sendo assim ela foi ter com sua avó e pediu que ela a ajudasse no encontro com o rapaz correto para ser seu noivo. Foi desse modo que Sr. Benecio chegou com um bilhete para Ricardo em que ele era chamado a casa da vó de Guida para resolver uma questão de advocacia. Chegando lá, Guida o recebeu afirmando que a vó estava a procura dos papéis. Assim, em conversa na sala enquanto a dama de companhia de Guida lia, a menina falou a Ricardo sobre um romance que lia, mas na verdade contava sua própria história. Afirmava que a heroína devia se casar agora que já tinha chegado na idade combinada com o pai, mas nunca homem algum tinha despertado seu coração, por isso seu pai escolhera um que julgava reto e gentil e pediu que ele se cassasse com ela e que assim vivessem em conveniência e quem sabe o amor surgiria.

Em seguida perguntou o que faria Ricardo se fosse tal homem, ao que ele respondeu que não poderia ser tal, pois ele já era comprometido e assim contou sua história de vida e de como estava na corte a fim de juntar vinte contos para quitar as dívidas da hipoteca e poder casar-se e dar uma vida ao menos digna para a esposa, para a mãe, e para poder pagar o dote da irmã. Depois disto Guida chamou a vó e elas encenaram o motivo de limites de terra pelo qual chamaram Ricardo ali. 

Foi em casa e no seu quarto que Guida viu surgir-lhe de repente o amor, amava Ricardo, mas não podia tê-lo, pois tal era desde a infância comprometido com a prima. Assim, a menina passou a viver como aqueles que sofrem do amor. 

Dias depois o pai, notando a diferença na filha, veio falar-lhe. A menina revelou tudo e também a vontade de conceder os vinte contos para fazer a felicidade dele. O pai cedeu à vontade da filha e também esqueceu a necessidade de casá-la. Assim Guida pediu a D. Guilhermina que se aproveitando do flerte que mantinha com Fábio descobrisse um modo de quitar as dívidas de Ricardo sem que esse recusasse tal ato. 

Foi deste modo que Guida, ouvindo a conversa de Fábio e D. Guilhermina, descobriu que a Bela havia rompido com Ricardo, que estava desolado. O fato era que em São Paulo, Luísa recebeu uma carta em que Fábio lhe contava como Ricardo não via o amor da mais rica e bela moça da corte por ser voltado ao amor por Bela, esta que lera a carta também. Porém na casa de Bela um amigo contava em uma carta que recebera que na corte Ricardo era um dos candidatos mais promissores a um rico casamento. Assim Bela, vendo que tal casamento era melhor para Ricardo, rompeu tudo com ele e aceitou se casar com um primo de escolha do pai. 

Ricardo tendo recebido a carta de Bela procurou Guida, os dois conversaram e quando ela leu a carta viu o que realmente se passava com a rival, que abandonava seu amor pela sorte dele. Aconselhou que Ricardo fosse a São Paulo e lhe explicasse todos os fatos, porém ele só escrevera uma carta bem fria e assim se confirmou as suspeitas de Bela, que se casou com outro. 

Saído a notícia do casamento de Bela, Ricardo ficou desolado e por muito tempo ele e Guida não se viram. Um dia enfim se encontraram no local de seu primeiro encontro. Guida, porém, estava com a saúde arrasada e perdera toda a vida de pouco tempo atrás. Ali os dois conversando relembraram o primeiro encontro foram colher a florzinha que ilustrara a cena. Guida desfaleceu nos braços de Ricardo e se pôs a chorar. Ele temia a morte da menina e a pediu que vivesse. Quando Guida questionou porque razão deveria viver, Ricardo afirmou que vivesse por ele. 

Foi assim que o casamento dos dois se arranjava em alguns dias. Mrs. Trowshy, a dama de companhia de Guida, se animava com a ida para Europa junto com a sua senhora. 

Sr. Benicio trabalhava no casamento. Fábio casara-se. Nogueira conformara-se com a advocacia administrativa. Guimarães foi para a Europa gastar a herança. Bastos continuava um bom encomendador.