Casa de Pensão (Aluísio Azevedo)

Amâncio da Silva Bastos e Vasconcelos, rapaz rico e provinciano, abandona o Maranhão e segue de navio para o Rio de Janeiro (à Corte) a fim de se encaminhar nos estudos e na vida. É um provinciano que sonha com os deslumbramentos da Corte. Chega cheio de ilusões e vazio de propósitos de estudar... A mãe fica chorosa e o pai, indiferente, como sempre fora no trato meio distante com o filho. O rapaz tinha que se tornar um homem.
Amâncio começa morando em casa do Sr. Campos, amigo do Pai, e, forçado, se matricula na Escola de Medicina. Ia começar agora uma vida livre para compensar o tempo em que viveu escravizado às imposições do pai e do professor, o implacável Pires.
Por convite de João Coqueiro, co-proprietário de uma casa de pensão, junto com a sua velhusca mulher Mme. Brizard, muda-se para lá. É tratado com as maiores preferências: os donos da pensão queriam aproveitar o máximo de seu dinheiro e ainda arranjar o seu casamento com Amélia, irmã de Coqueiro (um sujo jogo de baixo interesses, sobretudo de dinheiro). Naquele ambiente, tudo ocorria para fazer explodir a super-sensualidade do maranhense.
A casa de pensão era um amontoado de gente, em promiscuidade generalizada, apesar da hipócrita moralidade pregada pelo seu dono: havia miséria física e moral, clara e oculta. Com a chegada de Amâncio, a pensão passou a ser uma arapuca para prender nos seus laços o jovem inexperiente e rico estudante: pegar o seu dinheiro e casá-lo com a irmã do Coqueiro. (Amâncio passara a pagar todas as contas da família).
Para alcançar o casamento de Amâncio com Amélia todos os meios eram absolutamente lícitos. Amélia, principalmente quando da doença do rapaz, se desdobrou nos mais íntimos cuidados. Até que se tornou, disfarçadamente, sua amante sempre mantendo as aparências do maior respeito exigido dentro da pensão pelo João Coqueiro... Amélia se oferecia o tempo todo.
O pai de Amâncio morre no Maranhão. A mãe chama o filho. Ele pretendo voltar logo que terminem os seus exames de medicina. Era preciso que o filho voltasse para vê-la e ver os negócios que o pai deixara. Mas o rapaz está preso à casa de pensão e à Amélia: esta o ameaça e só permite sua ida ao Maranhão, depois do casamento com ela.
Amâncio explicava que precisava muito ir ver a sua mãe necessitada. Mas, Amélia, morrendo de ciúmes dele ir-se embora e conhecer outras mulheres no Maranhão, protestava: ele não iria jamais!
Então Amâncio prepara sua viagem às escondidas. Mas, no dia do embarque, um oficial de justiça acompanhado de policiais o prende para apresentação à delegacia e prestação de depoimentos. Amâncio é acusado de sedutor da moça. João Coqueiro prepara tudo: o caso foi entregue ao famigerado Dr. Teles de Moura. Aparecem duas testemunhas contra o rapaz. Começa o enredado processo: uma confusão de mentiras, de fingimentos, de maucaratismo contra o jovem rico e desfrutável para os interesses pecuniários de Mme. Brizard e marido. Há uma ressonância geral na imprensa e, na maioria, os estudantes se colocam ao lado de Amâncio.
O senhor Campos prepara-se para ajudar o seu protegido, mas Coqueiro lhe faz chegar às mãos uma carta comprometedora que Amâncio escrevera à sua senhora, D. Hortênsia. (pois Amâncio se envolvia sentimentalmente com as mulheres casadas da pensão, em especial Hortência, esposa de Campos). Campos então se coloca contra quem não soube respeitar nem a sua casa...
Amâncio continua preso. Três meses depois de iniciado o processo, Amâncio é absolvido. O rapaz é levado em triunfo para um almoço, no Hotel Paris. Todo mundo olhava com curiosidade e admiração o estudante absolvido. E lhe atiravam flores, Ouviam-se vivas ao estudante e à Liberdade. Os músicos alemães tocaram a Marselhesa. Parecia um carnaval carioca.
Em outro plano, Coqueiro, sozinho, via e ouvia tudo. Sua alma estava envenenada de raiva. Quando em casa, sua mulher o acusava de todo o fracasso. As testemunhas reclamavam o pagamento do seu depoimento. Um inferno dentro e fora dele. Chegaram cartas anônimas com as maiores ofensas. Um homem acuado... Tinham-lhe acabado a vida boa.
Coqueiro também tinha muita vergonha do que a cidade estava comentando sobre a sua irmã prostituída. Não poderia isso ficar assim.
Pegou, na gaveta, o revólver do pai. E pensou em se matar. Carregou a arma. Acertou o cano no ouvido. Não teve coragem. Debaixo da sua janela, gritavam injúrias pela sua covardia e mau caráter... No dia seguinte, de manhã, saiu sinistro. Foi ao Hotel Paris. Bateu no quarto II, onde se encontrava o estudante com a rapariga Jeanete. Esta abriu a porta. Amâncio dormia, depois da festa e da bebedeira, de barriga para cima.
Foi então que Coqueiro atirou a queima-roupa em Amâncio. E Amâncio passa a mão no peito, abre os olhos, não vê mais ninguém. Ainda diz uma última palavra: mamãe ... e morre.
Coqueiro foi agarrado por um policial, ao fugir. A cidade se enche de comentários. Muitos visitam o necrotério para ver o cadáver de Amâncio. Vendem-se retratos do morto. Um funeral grandioso com a presença de políticos, notícias e necrológicos nos jornais, a cidade toda abalada. A tragédia tomou conta de todos.
A opinião pública começa a flutuar, a mudar de posição: afinal, João Coqueiro tinha lavado a honra da irmã...
Quando D. Ângela, envelhecida e enlutada, chega ao Rio de Janeiro, se viu no meio da confusão, procurando o filho. Numa vitrine, ela descobriu o retrato do filho na mesa do necrotério, com o tronco nu, o corpo em sangue. Uma legenda: Amâncio de Vasconcelos, assassinado por João Coqueiro, no Hotel Paris...